Cléber Camargo Rodrigues é um itabirano síntese,
apaixonado pela palavra, gosta de se misturar aos
artistas da música, conhece suas glórias e dores, sempre dialogando com os
afins, movendo projetos e mais projetos, ativista, guerrilheiro cultural,
sonhador e realizador, colunista, produtor zen, mas inquieto; exigente, mas
sedento de novidades. Logo que comuniquei ao editor do Jornal que pretendia entrevistar o Cleber ele já foi citando o "Meninos de Minas",projeto que notabilizou
o Cléber como produtor diferenciado, capaz de mover importantes projetos
culturais e que ainda consegue manter uma postura otimista perante as mudanças, blindado com uma espécie de
couraça poética pra sobreviver com arte. Mas vamos à entrevista...
MEDIOPIRA - Você é poeta, produtor, gestor cultural, escritor. Entre tantos ofícios qual é o dominante?
MEDIOPIRA - Você é poeta, produtor, gestor cultural, escritor. Entre tantos ofícios qual é o dominante?
CLEBER - Acho que ser ajuntador de sonhos é o que
caracteriza minha vida, minha sina. Em tudo que faço (ou traço) há uma pontinha
de sonhos. Escrever uma poesia ou um projeto é um exercício de sensibilidade
que permeia cada um de meus dias. De forma igual, produzir um evento ou
gerenciar uma entidade ou projeto carrega a mesma necessidade. Esta
sensibilidade vale pra toda atividade humana, mas costuma ser mais explícita no
campo da cultura e das artes.
MEDIOPIRA - Como é a convivência entre o artista e o gestor?
CLEBER - A dor e a delícia de criar um texto,
riscar um desenho ou fazer uma foto é tão intensa e interessante quanto
produzir um evento, um disco, um projeto. É tudo muito parecido. É misturado.
Uma mão leva à outra.
MEDIOPIRA - O que você acha da poesia em tempos virtuais? Acha que a internet banaliza
ou depura a partir da quantidade?
CLEBER - A internet democratiza tudo e oportuniza
a difusão de uma forma de arte e de agir. Nas redes virtuais, todo mundo pode
ser o que quiser e até mesmo ser o que não é. Muita coisa boa aparece e
surpreende. Muita coisa de qualidade duvidosa aparece e surpreende também. A
possibilidade está diante de todos. Cabe a cada um achar o filtro próprio.
Estamos todos a um clique do sonho ou do pesadelo virtual. É uma questão de
escolha daquilo que serve ou não pra cada um de nós.
MEDIOPIRA - Você é uma pessoa que construiu uma parte da sua história num mundo ainda
analógico. Hoje é tudo digital. Como você trabalha isso? Atualizou-se ou tem
dificuldades com esse novo mundo?
CLEBER -Eu tenho uma grande dificuldade com a
tecnologia, com a vida digital. Minha filha pequena costuma encurtar alguns
caminhos que eu não consigo caminhar sem embolar a cabeça.
Tento aprender bem devagar, com calma pra
não estressar.
Pra falar a verdade, eu sou quase uma
‘anta digital’, mas eu ainda não desisti.
MEDIOPIRA - Você foi superintendente da Fundação Carlos Drummond de Andrade. Quais
foram seus orgulhos e frustrações dessa época?
CLEBER -A oportunidade é tudo para o ser humano.
Eu tive uma oportunidade de ouro. A alegria maior é a certeza que nossa equipe
fez o melhor e colheu frutos deste empenho. Conseguimos contribuir pra história
de nossa terra. A frustração ficou no passado, como ficam algumas das melhores
lições da vida. Foi tudo muito intenso, como deve ser um trabalho na área
cultural. As alegrias superaram as frustrações. Demos um passo na caminhada desta
vida corrida. Daquele tempo, alguns projetos marcaram a história cultural na
nossa cidade. Lembro com carinho da intensa programação do Centenário de Carlos
Drummond de Andrade, criação do projeto Drummonzinhos, reconstituição da
Fazendo do Pontal, restauração e aquisição da Casa de Drummond, ônibus
Biblioteca Drummond Sobre Rodas, Seminário Internacional de Produção Musical,
Seminário Cultural do Sudeste (preparatório para o Fórum Cultural Mundial),
festivais de inverno, lançamentos de livros e CDs, regulamentação da Lei
Drummond de Incentivo à Cultura, Fórum Luso-Brasileiro, entre tantos outros. Passa
um filme na gaveta da memória, quando penso na alegria de nossa equipe a cada
desafio vencido.
MEDIOPIRA -Vemos a tecnologia assumindo funções antes executadas por seres humanos em
todas as áreas. Acha que isso vai chegar ou já chegou as artes?
CLEBER -Já chegou com força, mas tem espaço pras
coisas que são feitas à unha, na raça, sem tecnologia. Há diálogos possíveis e
necessários, mas há espaço em que uma coisa não condiz com a outra. É preciso
achar o que valoriza sem descaracterizar. Sem afrontar a raiz.
MEDIOPIRA -Como você vê a música atualmente? Tem espaço para a qualidade num mundo
onde o público comum prefere a monocultura da música sertaneja?
CLEBER -Hoje temos mais qualidade ao nosso
alcance. A difusão é que costuma dar a impressão que tudo é nivelado por baixo,
mas não é. Eu acredito que ainda vamos conseguir achar o fio da meada e mostrar
que a qualidade é maior que “o sucesso” que anda mandando em nossa música de
uma forma geral.
Há muita coisa bacana pra gente ver e
ouvir. É preciso estar atento nesta travessia.
MEDIOPIRA -A internet para você auxilia ou esmaga os artistas?
CLEBER -A internet é a melhor forma de difusão
cultural que temos. A internet só não é melhor que o “boca a boca” que sai do
coração, que arrepia a pele e faz você querer falar pra todos que gostou
daquele artista, daquela música. Um curtir e compartilhar orgânico é melhor e
mais forte, é mais perene do que uma viralização induzida.
MEDIOPIRA -Sobre a cena musical atual, você consegue garimpar coisas boas, no meio de
tanta poluição musical?
CLEBER -Todo dia, acho artistas fantásticos. A
poluição não alcança meus sentidos. Eu procuro ouvir coisas novas pra reciclar
os desejos e a vida.
MEDIOPIRA -Como você vê a cena itabirana da atualidade? E do Médio Piracicaba?
CLEBER -Itabira está lotada de gente com
condições de ganhar os palcos do mundo. Há muita qualidade e muitas novidades
boas nesta terra Drummondiana.
O Médio Piracicaba também tem uma série
de artistas realizando um trabalho com muita competência. Conheço alguns, mas
acho que é preciso encurtar a distância que temos de Itabira às outras cidades
da região. É uma situação muito parecida com o que acontece entre o Brasil e a
América Latina. Somos parte, mas ainda não compartilhamos e somamos da forma
que poderíamos.
MEDIOPIRA -Você certa vez sugeriu a
baianização da música itabirana, tentando juntar a turma pra criar uma cena
poderosa e focada. Deu certo?
CLEBER -Eu acho que é um processo. Nós todos
estamos aprendendo e reaprendendo a arte da caminhada coletiva. Estamos no meio
do caminho, com algumas pedras à frente, com alguma vontade na mente, com
algumas certezas, com uma sorte invisível, mas estamos aprendendo sempre. Com
os baianos e com os ipoemenses, precisamos aprender a arte da união e da generosidade
em torno de um ideal que seja coletivo. Há muita semente pra plantar. Há mais
frutos pra colher do que a gente possa imaginar.
MEDIOPIRA -Na questão da poesia. Acha que continuará a sobreviver no papel ou seu
caminho também é a nuvem e o universo virtual?
CLEBER -O livro não acabará nunca. O universo
virtual ajudará a popularizar a poesia nossa de cada dia. Um dia, a poesia será
mais oral que impressa ou virtual. A poesia ainda será incorporada à cesta
básica de necessidades humanas e terá lugar na sala de ser e de amar de todos
nós.
MEDIOPIRA - Sobre as leis de incentivo. Não acha que tem burocracia demais para que
um artista consiga viabilizar sua arte?
CLEBER -A burocracia não é demais. Precisamos
formar mais produtores, gestores e administradores culturais para dar vazão a
tanta arte carente de espaço e difusão. Alguns artistas precisam de produtores.
Outros dão conta de fazer a própria produção – por talento ou por necessidade.
MEDIOPIRA - Quais são os seus projetos do momento? Em que está envolvido na
atualidade?
CLEBER -Estou produzindo um CD dos Meninos de
Minas. Tenho sonhando em dedicar à poesia uma parte maior do meu tempo. É um
projeto, é uma parte dos sonhos que carrego no meu embornal da cor de burro
fugido.
MEDIOPIRA - Seu trabalho é mais concentrado em Itabira ou atua em outras freguesias também
CLEBER -Ao longo de
quase quarenta anos de produção cultural, tenho tentado construir algumas pontes
fora de Itabira, em outros países e cidades. Acho que nenhuma cidade, do
tamanho ou menor que a nossa, consegue consumir tudo que produz na área
cultural. O público consumidor ainda é pequeno. É preciso outros caminhos e
mercados pra ampliar os horizontes. Vou tentando achar estas possibilidades pra
fortalecer o que fazemos aqui. Quase sempre, a vida é uma tentação, mas há
alegrias plurais nesta caminhada.
MEDIOPIRA - Deixe alguns links
para o seu trabalho.
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