sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

LUTÉCIA, A ONIPRESENTE

O MEDIOPIRA dessa semana entrevista a fotógrafa, rockeira, agente cultural e política, poetisa e bancária Lutécia Espeschit, testemunha sensorial de quase tudo que aconteceu em sua João Monlevade e no MEDIO PIRACICABA nas últimas décadas. Lembro-me de uma fase em que apareciam fotografias Lutecianas de três eventos diferentes no mesmo dia e me perguntava: como ela consegue? Alias, as irmãs Espechit  são um caso lindo de amor ao rock. Não perdem um grande show das grandes bandas que desembarcam no país. Mas vamos então à entrevista com a Lutécia,  uma das pessoas mais “pau pra toda obra” que conheço, participando de tudo que diga respeito à arte e a cultura.

MEDIOPIRA –Você desde sempre esteve conectada aos movimentos artísticos e culturais de Monlevade. Como foi o seu despertar para esse olhar? Quais foram suas influências?


Lutécia - Minha mãe era poetisa, piadista, pintora, artesã, cantora e, desde menina, acompanhava os ensaios que aconteciam em minha casa, na Monlevade dos Anos Dourados, quando ela cantava acompanhada por um Regional, em festas, jantares e acontecimentos sociais, e nos ensaios do Coral Monlevade, na década de 70. Além disso, ela abria a nossa casa para vários músicos, como Eustáquio Ambrósio, Weber Costa, Severino Miguel, Vilminha, que se reuniam ora para ensaiar, ora para transformar a nossa vida numa constante festa. E era.


MEDIOPIRA – Sua paixão pela fotografia é recente? Você é contemporânea dos processos produtivos analógicos, de revelar fotografias, das técnicas clássicas ou totalmente digital?

Lutécia - Sempre fui uma amante das imagens, dos reflexos e até das sombras que são projetadas por corpos em movimento. A fotografia veio para “materializar” o meu olhar, quando ganhei, aos 16 anos de idade, uma Kodak, daquela de filmes de cartucho. Fotografava pouco, por causa do custo das revelações, e ainda tenho muitos filmes a serem revelados, perdidos em muitos guardados. Mas quando as máquinas digitais se popularizaram, no início desse Milênio, comecei a fotografar quase que diariamente e, de alguns anos pra cá, compulsivamente. Posso dizer que sou formada por quatro partes: cabeça, tronco, membros e câmera fotográfica.

MEDIOPIRA – Vejo que em sua fotografia tem um lado muito forte de capturar paisagens.  Nesse tipo de enfoque a fotógrafa torna-se quase uma poetisa visual, uma caçadora de acasos revelando a alma das coisas. Você se sente um pouco poetisa também quando fotografa?

Lutécia - Troquei os meus poemas caligrafados no passado, pelos fotografados na atualidade, rsrsrsrs. Meu olhar, naturalmente, enquadra tudo o que vejo, e vejo que estamos cercados de belezas que passam despercebidas para a maioria das pessoas, ocupadas demais, preocupadas demais em como viver e até sobreviver nesse mundo de tantas mazelas. No instante em que fotografo paisagens, ou pássaros e aves, que são os meus motivos preferidos, sinto que aquele belo e único momento precisa ser mostrado, admirado,  e as redes sociais são a melhor ferramenta para compartilha-lo com todos. Não comercializo fotos e raramente as imprimo. Elas são feitas pelo puro prazer de registrar e distribuir toda a beleza que o Universo nos presenteia a cada dia, a todos que eu puder alcançar.

MEDIOPIRA – Na sua fotografia tem um lado forte também de jornalismo cultural. A sua cobertura de eventos era marcante, independente, quase onipresente. Parece que você diminuiu bastante essa presença nos últimos tempos. Por que?

Lutécia - Porque os eventos culturais também diminuíram, tornando-se quase uma raridade. De um lado, o Poder Público, que nada realiza. Do outro, a iniciativa privada, que não diversifica. Outro motivo é que precisei sair de Monlevade para dar prosseguimento à minha carreira de bancária, cuja oportunidade de promoção veio quando fui emprestada para a agência de Dom Silvério por um mês, e aqui estou desde janeiro de 2013.

MEDIOPIRA – Você sempre foi uma roqueira fanática, quase torcedora (rs). Como avalia a atual situação do rock? Acha que rock virou música para coroas ou que a coroa continuará sendo do rock como estilo mais popular do planeta?

Lutécia - O Rock sempre terá o seu espaço e tenho percebido que nos últimos dois, três anos, tem tido presença garantida e concorrida no cenário musical brasileiro. A alma do rock é inquieta, rebelde, revolucionária, e o Brasil tem oferecido muita “matéria-prima” para o surgimento de novas composições e novas bandas roqueiras, que aos poucos vem retomando o seu lugar no trono dos mais apreciados estilos musicais por todo o mundo.

MEDIOPIRA – E em termos de ROCK BRASIL? Tem visto alguma coisa digna de nota? Apontaria algum trabalho novo que tenha te balançado?

Lutécia - Se dermos uma voltinha pela internet, pelo YouTube por exemplo, veremos centenas de bandas independentes de Rock, da melhor qualidade, em todos os cantos desse nosso Brasil. Mas vou citar duas que me impressionaram: Carne Doce, uma banda goiana, quase lírica e Amazon, de Valinhos-SP, que esteve no 1º Festival Marmotas em Monlevade, em 2014. Fugindo um pouco do Rock, mas indo na sua origem, a que mais curto na atualidade é Alexandre da Mata & The Black Dogs, de Belo Horizonte.

MEDIOPIRA – E em João Monlevade? Já houve um tempo de muita efervecência da cena roqueira. Vc conseguiria citar algum trabalho em especial ou são os mesmos de sempre? E no Médio Piracicaba? Citaria algum trabalho novo interessante?

Lutécia - Sou fã incondicional da Derramasters, cujo trabalho autoral, em Monlevade, é insuperável, mas por força de trabalho e estudo de seus integrantes, está em stand-by.  A Dizarm também tem feito um trabalho autoral bem interessante. Mas sem estímulo, sem apoio e sem palco, várias bandas surgem do nada e desaparecem da mesma forma.  

MEDIOPIRA – Há alguns anos  a meninada quando chegava à adolescência queria tocar numa banda de rock ou jogar num time de futebol. O que a galera nova quer hoje?

Lutécia - Iphone, rsrsrsrsrs.



MEDIOPIRA – Você hoje vive entre Monlevade e Dom Silvério. Como foi essa transição entre o movimento frenético de Monlevade e a tranquilidade de DS?

Lutécia - Vivo muito bem integrada a esses dois mundos. Em Dom Silvério, levo uma vida de trabalho e enriqueço minha alma com as “saidinhas de banco” para a Área Rural, onde faço minhas fotos. Em Monlevade, vida noturna, sempre onde tem boa música, não necessariamente só Rock, e estar com a família, novos e velhos amigos e boas companhias. Sou uma pessoa de fácil adaptação, acostumada na estrada desde 1978, quando saí de Monlevade para estudar em Porto Alegre, e nunca mais parei de rodar por aí.

MEDIOPIRA – Existe um grande pessimismo no meio cultural com relação ao futuro. Há uma percepção de que a arte vem perdendo importância na lista de prioridade das pessoas. Como você acha que a arte vai sobreviver nesse clima de “apocalipse now”?


Lutécia - Nada sobreviverá à insensibilidade das pessoas para o que realmente tem valor: a beleza da vida.