O MEDIO PIRA é um espaço novo, coluna publicada no Jornal BOM DIA, que vai trazer a cada semana entrevistas com personalidades da arte e cultura do Médio Piracicaba. E Já
começamos entrevistando uma das pessoas que mais movimenta a cena artística de
João Monlevade: a onipresente CARLA LISBOA, uma produtora que merece todos
os aplausos e reconhecimentos. Tenho até dificuldades em defini-la. Multi-tarefas?
Camaleoa? Tudo e mais um pouco! Carla é atriz, produtora, militante da área
cultural, mega gentil no trato, trabalha em silêncio, parece até oriental de
tão zen, pau pra toda obra, sensível para as causas artísticas, tem uma super
vontade de ajudar os artistas a botar o pé na profissão, é co-fundadora do
Coletivo 7 faces, que promove diversos festivais de música e cultura...e inventa
uma enorme quantidade de eventos com pouquíssima verba, mas com grande
qualidade. E o principal: abrindo vitrines para a nova arte produzida na região
e em todo o Brasil. Não sei se a turma local concorda, mas em minha opinião
ninguém e nenhuma instituição movimentam mais a cena local do que ela e a turma do 7 faces. Mas vamos à entrevista...
MEDIOPIRA: Carla Lisboa. O que te move a
abraçar a arte e cultura com tanta força?
AMOR. Parece simples, mas infelizmente são raríssimas as pessoas que
realmente colocam PAIXÃO no que fazem, digo isso não apenas na área cultural. E
se tratando de cultura especificamente, que é tão pouco valorizada
principalmente em nossa região, se não amar o que faz, você não vai muito
longe. A arte pra mim é como um órgão vital, como o coração, aliás, como o
pulmão, sem ela eu não conseguiria nem respirar.
Acho que sempre fez parte. Quando criança, preferia ficar no quarto
lendo um livro a sair pra brincar. Sempre gostei de escrever, de inventar
histórias.... comecei com o teatro ainda adolescente, pra “curar a timidez”.
Fiz alguns cursos livres e oficinas de teatro, até ir para o Galpão, em BH. O
trabalho como produtora surgiu um tempo depois, em 2008, e desde então, tive a
certeza de que era o que eu queria fazer pra vida toda.
MEDIOPIRA: Você se considera mais atriz ou mais produtora cultural?
É difícil responder. Apesar do trabalho como produtora ser mais intenso,
o teatro é minha grande paixão, sinto falta de atuar, de estar nos palcos. Mas
não me imagino sendo apenas atriz, ou somente produtora. Acho que sou todas em
uma só.
MEDIOPIRA: Como você avalia o público consumidor de arte na região? Tem
espaço por exemplo pra música que não seja a popularesca consumida pela massa?
Sempre que se fala em arte aqui na região, costumo ouvir em coro: Ah,
aqui o público só gosta de sertanejo. Só consome evento de massa. A primeira
ação do Coletivo 7faces foi o Grito Rock, em 2013, e muita gente apostou que
não passaríamos da segunda edição; bom, esse ano já estamos indo pra quarta. A
música sempre foi nosso “carro chefe”, mas esse ano estamos reformulando o
coletivo, vamos focar mais na literatura e no teatro, mas claro, mantendo os
festivais de música que já realizamos. Iniciamos essa mudança com o Sarau das
7faces, que é um evento mensal, e a cada edição o público vem aumentando. Acho
que funciona como a lei da oferta x demanda. O público consome o que é
oferecido. Tem espaço pra todos.
MEDIOPIRA: Como é que funciona a 7 faces?
Na raça! (risos). Somos uma equipe pequena. Temos muitos colaboradores,
mas a equipe “fixa” do coletivo é formada por 3 ou 4 pessoas, de áreas
totalmente diferentes, mas todos ativistas culturais. Apesar de ser a gestora e
estar à frente do coletivo, não decido nada sozinha, não temos hierarquia, tudo
que fazemos é decidido em grupo.
MEDIOPIRA: Como você avalia o cenário da arte em Monlevade hoje em dia?
Nossa cidade é muito rica culturalmente,
temos muitos artistas tanto na música, quanto no teatro, na dança, literatura, artes
plásticas... e muitos talentos escondidos. O que falta ainda é apoio e espaço
para esses artistas mostrarem seus trabalhos. Falo de apoio de um modo geral,
principalmente do público.
MEDIOPIRA: Creio que tenha sido enriquecedor pra você integrar uma instituição
pública, no caso a Fundação Casa de Cultura de Monlevade. Valeu à pena?
Estive na Fundação Casa de Cultura por 14 meses, e foi uma experiência
bem enriquecedora pra mim. Valeu a pena com certeza, toda experiência é válida.
Aprendi muito no tempo em que estive lá.
MEDIOPIRA: Como tem sido a relação com as empresas locais? Elas tem
reconhecido o trabalho de vocês patrocinando os eventos? E o poder público?
Não trabalhamos apenas com valor monetário. O coletivo trabalha com a
economia solidária e criativa. Em todos os eventos que realizamos,
contabilizamos como moeda todo tipo de apoio, seja financeiro, mão-de-obra,
divulgação, etc. E tanto das empresas privadas quanto do poder público, esse
reconhecimento infelizmente nunca ultrapassou 10% de nossos custos.
MEDIOPIRA: Quais você considera as principais deficiências da cena
artística da região?
Bom, não vou falar das deficiências num contexto geral, já que são
tantas. Vou falar da minha realidade, aliás, da realidade do coletivo.
Trabalhamos com a cena independente e autoral, principalmente na música, e a maior
deficiência que temos, e muitos músicos da região também reclamam comigo, é da
falta de um espaço para que esses artistas possam mostrar seu trabalho. Não
temos espaço para a cena autoral. E em João Monlevade ainda é pior: além da
falta de espaço pra cena autoral, artistas locais ainda são poucos valorizados.
E o Coletivo 7faces surgiu para suprir essa carência, dar espaço e valorizar a
cena autoral, e provar que santo de casa faz sim milagres.
MEDIOPIRA: E as principais qualidades?
A região é muito rica culturalmente. Temos oferta pra todos os gostos e
públicos. E aqui na cidade o que tenho percebido também, é que o público tem
participado mais ativamente dos eventos culturais. Há um ano atrás, citei em
uma entrevista que nosso maior desafio era a formação de público, hoje já penso
diferente.
MEDIOPIRA: O que você planeja para um futuro próximo? Quais os próximos
eventos do 7faces e planos da Carla Lisboa?
O 7faces tem um calendário fixo, e também já estamos em processo de
certificação do coletivo como um Ponto de Cultura na cidade. Além do Grito Rock
e do Festival Marmotas que este ano chegam à 4ª edição, faremos também o 1º
Festival de Inverno de João Monlevade, entre os dias 18 a 25 de junho. E tem também
o Sarau que realizamos mensalmente, na Praça do Coreto.
Esse ano quero me dedicar mais ao teatro. Iniciei esse mês as oficinas
de teatro pela Cia Os Issos, onde iremos preparar um espetáculo para comemorar
os 400 anos de William Shakespeare. E a partir de abril, também pela Cia Os
Issos, faremos audição para bailarinos, com a proposta de montagem de um
musical intitulado “Quadros”, em homenagem ao músico, compositor, diretor e
ator Oswaldo Montenegro, que é uma das minhas principais influências no teatro,
e também da Cia Os Issos.